Irmãos unidos pela adoção internacional
Fazer parte de uma afetiva e responsável família é o sonho de muita criança e adolescente acolhida em abrigo. Quando se tem irmãos, o desejo é maior: que todos consigam realizar o sonho juntos.
Embora o número de pretendentes, tanto no Brasil quanto no Rio Grande do Sul, seja dez vezes superior ao de aptos à adoção, o perfil ‘com irmãos’, tem dificultado esse cruzamento. Das 308 crianças e adolescentes gaúchas cadastradas no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), mais de 54% têm irmãos. Mas esse fator não tem sido um entrave para as adoções internacionais. Atualmente, desse total, 93 estão indicadas para essa modalidade de adoção.
No início deste ano, um casal de portugueses, com residência na Espanha, comemorou a adoção de duas meninas da cidade de Cerro Largo. Na última semana, um casal de americanos chegou a Porto Alegre para iniciar o estágio de convivência com duas irmãs, de 13 e 16 anos. Além dos prováveis e futuros pais, as adolescentes vão conhecer pessoalmente os irmãos americanos e os avós maternos que também virão à Capital. Uma videochamada foi o primeiro contato de um italiano, casado com uma polonesa, com quatro irmãos de Santo Ângelo, três meninas de 3, 5 e 9 anos e um menino de 7. Outros três encontros virtuais estão previstos antes deles aterrissarem em solo gaúcho.
Para o Presidente da Comissão Estadual Judiciária para Adoção Internacional (CEJAI) do TJRS, Desembargador Giovanni Conti, a adoção internacional é uma importante ferramenta para colocação de crianças e adolescentes em lar substituto.
“A adoção internacional é a exceção e vem sendo uma iniciativa positiva. Normalmente, os pretendentes já cadastrados e selecionados pelos seus países não possuem restrições sobre condições de saúde, cor ou idade das crianças”, destaca o magistrado.
Só após esgotadas as tentativas de adoção nacional, a busca rompe fronteiras. Segundo o Secretário-Executivo do CEJAI, Juiz-Corregedor Luís Antônio de Abreu Johnson, a primeira tentativa é o retorno da criança ou adolescente à família, garantindo assim o “princípio da prevalência da família de origem”. Na impossibilidade, geralmente em razão de uma violação de direito, com destituição do poder familiar, busca-se a colocação em família substituta pela adoção nacional, sendo a internacional a última alternativa, como forma de assegurar a convivência familiar e comunitária, direito fundamental reconhecido pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Apesar de a adoção internacional ter previsão legal desde 1993, com a Convenção de Haia, ratificada pelo Brasil em 1999 e recepcionada pelo ECA, o assunto ainda é visto com certo estranhamento por quem desconhece a matéria e os procedimentos adotados. Ao destacar a seriedade dos procedimentos, a Assistente Social da CEJAI, Graziela Milani Leal, explica que as adoções ocorrem entre países signatários da Convenção de Haia, que exige uma série de protocolos.
Cada país possui um órgão federal responsável pelo cumprimento das obrigações impostas pela Convenção. No Brasil, a Autoridade Central Administrativa Federal (ACAF) é um órgão do Ministério da Justiça. Como o Judiciário é quem tem a competência para lidar com os pedidos e processos de adoção, ficou regulamentado que cada Estado, dentro do Tribunal de Justiça, implanta a sua autoridade central estadual que no caso do RS é a Comissão Estadual Judiciária para Adoção Internacional (CEJAI). A Comissão foi criada a partir de lei estadual de 2015, com funcionamento efetivo em 2016, quando o TJRS aprovou o regimento interno do órgão, prevendo composição, organização e fluxos de trabalho.
O procedimento de adoção internacional exige muitas etapas e segue protocolos bem definidos. Após todo o trâmite do processo nas varas e equipes técnicas que atuam com a matéria da infância e juventude, os magistrados fazem a indicação da criança e do adolescente ao CEJAI, responsável pela intermediação com o país estrangeiro.
Segundo a Assistente Social, entre os pré-requisitos para a adoção internacional estão a certidão de esgotamento comprovando as buscas realizadas sem êxito no Brasil e o trânsito em julgado da destituição familiar, com situação jurídica definida. “A intenção é garantir a menor mudança possível para a criança, que não precise ser afastada de suas raízes, da comunidade em que cresceu, onde já tem vínculos e da escola. Tenta-se fazer a colocação da criança em um nível mais próximo da realidade dela, por isso o sistema está programado pra buscar primeiro no âmbito da comarca, depois estadual e nacional. Esgotando os três níveis, passa para o internacional”.
Além dessas exigências, são necessárias a compreensão e concordância da criança e do adolescente com o procedimento de adoção. A escuta é realizada nos juizados onde tramita o processo com posterior indicação da criança para o CEJAI por intermédio do magistrado. Na ponta do árduo trabalho, em parceria com a equipe da CEJAI, estão Juízes, Técnicos Judiciários, Oficiais de Justiça, Analistas, Assistentes Sociais e Psicólogos na busca por concretizar os direitos das crianças e dos adolescentes.
Na Comarca de Santo Ângelo, a Assistente Social Ilone Loebens vem acompanhando de perto as adoções internacionais. Ela e a psicóloga Aline Scheffer de Menezes estão envolvidas na preparação de um grupo de quatro irmãos em processo de adoção por uma família italiana. Conversas com as crianças sobre a Itália, a região onde provavelmente vão morar, os costumes e hábitos são assuntos que antecipam a vinda dos italianos marcada para o mês de outubro. Com a chegada deles, inicia-se o estágio de convivência, no qual as crianças e os futuros pais passam a conviver em uma casa por cerca de 30 dias.
O trabalho exige muitas horas de acompanhamento e relatórios. Ilone conta que ainda recebem notícias em fotos, áudios e vídeos das primeiras crianças adotadas por outra família italiana em 2020. “É maravilhoso ver a transformação das crianças, por vezes, até surpreendente”, diz.
Com o objetivo de debater os procedimentos relativos à adoção internacional, o Secretário-Executivo do Conselho Estadual da CEJAI, Luís Antônio de Abreu Johnson, e Assistente Social Graziela Milani Leal participaram da 23ª Reunião do Conselho das Autoridades Centrais Brasileiras (CACB), no final do mês de setembro, no TJPR. No encontro, as autoridades centrais estaduais atualizam as discussões sobre o tema.
FONTE: TJPR – por: Sabrina Barcelos Corrêa / Diretora de Imprensa: Rafaela Souza | dicom-dimp@tjrs.jus.br